Você já quis saber mais sobre a lesão do ligamento cruzado anterior (LCA)? Sou o Dr. Murillo Cruz Mourão, médico ortopedista especialista em Cirurgia do Joelho, formado pelo Hospital das Clínicas da UFMG, e hoje vamos conversar um pouco sobre isso.
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O que é o ligamento cruzado anterior (LCA) e qual sua função?
O ligamento cruzado anterior do joelho (LCA) é uma das estruturas mais cruciais em termos anatômicos e funcionais dentro da articulação do joelho. É uma estrutura fibrosa, semelhante a uma corda, localizada no centro do joelho e que conecta o fêmur (osso da coxa) à tíbia (osso da perna). O LCA é composto por fibras de colágeno que se entrelaçam formando dois grandes feixes, conhecidos como banda póstero-lateral (maior) e banda ântero-medial (menor), que geralmente não são claramente distinguíveis a olho nu.
A função primordial do ligamento cruzado anterior é promover estabilidade rotacional na articulação, permitindo os movimentos com harmonia e evitando movimentos excessivos entre o fêmur e a tíbia. Além disso, ele desempenha um papel crucial na transmissão de informações sensoriais ao cérebro sobre a posição do joelho, como se a perna está dobrada ou esticada, graças aos mecanorreceptores conectados ao nervo tibial.
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Causas de ruptura do ligamento cruzado anterior – LCA:
A lesão do LCA geralmente acontece quando o ligamento é esticado além de sua capacidade normal, resultando em um rompimento parcial ou total. Os mecanismos mais comuns de lesão incluem:
– Movimentos de torção abruptos: Girar o corpo rapidamente enquanto o pé está fixo no chão pode causar uma torção excessiva no joelho.
– Mudanças rápidas de direção: Esportes que exigem paradas e arranques súbitos colocam grande pressão sobre o LCA.
– Aterrissagens inadequadas: Saltar e aterrissar com o joelho estendido ou em posição de valgo (quando o joelho “vai para dentro”) pode levar à lesão.
– Desaceleração súbita: Parar bruscamente ao correr pode forçar o LCA além do seu limite.
– Trauma direto: Embora menos comum, um impacto direto no joelho, como em uma colisão durante um jogo, pode causar a ruptura do ligamento.
Um exemplo ilustrativo é a lesão do jogador de basquete Klay Thompson. Durante um jogo, ele sofreu uma lesão do LCA ao realizar um movimento sem contato com outros jogadores. Ao saltar e aterrissar, seu joelho sofreu um movimento em valgo, deslocando-se para “dentro”, o que levou à ruptura do ligamento. Esse tipo de lesão sem contato é bastante comum em atletas que praticam esportes de impacto.
Vemos aqui no vídeo esse mecanismo da lesão:
https://www.facebook.com/watch/?v=2084087678560399
Quem está mais propenso à lesão do LCA?
Esportistas e pessoas ativas que participam de atividades envolvendo movimentos rápidos, mudanças bruscas de direção e saltos têm maior risco de lesão do LCA. Isso inclui esportes como:
– Futebol
– Handebol
– Basquete
– Vôlei
– Ginástica artística
Além disso, estudos indicam que as mulheres têm uma maior chance de sofrer lesões no LCA. Possivelmente devido a diferenças na anatomia, força muscular e padrões de movimento que podem afetar a estabilidade do joelho.
Sintomas:
Muitas pessoas descrevem uma sensação de que seu joelho está se movendo para um lado enquanto o corpo vai para o outro, ou que seus pés ficaram presos no chão enquanto o corpo continuou se movendo. É comum ouvir um som de estalo durante o incidente. Poucos minutos depois, o joelho costuma inchar significativamente e, junto com a dor, há uma progressiva dificuldade em dobrar e esticar o joelho, tornando até mesmo o ato de caminhar difícil.
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Tipos de ruptura: completa ou parcial.
Uma lesão do ligamento cruzado pode ser classificada como total ou parcial, dependendo da extensão do rompimento das fibras. Frequentemente, nos deparamos com relatórios de ressonância magnética que descrevem uma lesão parcial do LCA. Durante uma cirurgia de artroscopia, também é possível observar algumas fibras intactas e outras danificadas. O tratamento de uma lesão parcial varia conforme os sintomas do paciente, o exame físico realizado pelo médico antes da cirurgia e a aparência do LCA durante a intervenção cirúrgica.
Como é o tratamento?
O tratamento da lesão do LCA e do menisco depende da gravidade da lesão e do nível de atividade do paciente.
– Tratamento Conservador: Para lesões parciais ou em pacientes menos ativos, o tratamento não cirúrgico pode ser eficaz. Inclui fisioterapia para fortalecer os músculos ao redor do joelho, melhorar a estabilidade e restaurar a função. O acompanhamento conjunto de um cirurgião de joelho, fisioterapeuta e educador físico é fundamental para uma recuperação personalizada.
– Tratamento Cirúrgico: Para aqueles que desejam retornar a atividades físicas intensas ou que apresentam instabilidade significativa no joelho, a cirurgia é frequentemente recomendada. O procedimento pode incluir a reconstrução do LCA com o enxerto mais adequado para o paciente e a sutura meniscal, quando necessário, visando restaurar a estabilidade e a função do joelho.
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Lesões Associadas: O LCA e os Meniscos
Muitas vezes, a lesão do LCA pode vir acompanhada de danos ao menisco. O menisco é uma cartilagem em forma de “C” que atua como amortecedor entre os ossos do joelho, ajudando a absorver impactos e a distribuir o peso de forma equilibrada.
Quando o LCA é rompido, a estabilidade do joelho fica comprometida, aumentando o risco de lesionar o menisco. Uma lesão no menisco pode causar dor adicional, inchaço e dificuldade para movimentar o joelho, além de aumentar a chance de desenvolver problemas articulares no futuro.
E o diagnóstico?
A detecção da ruptura do Ligamento Cruzado Anterior engloba:
- Análise do histórico do paciente, incluindo informações sobre a entorses, sintomas relatados desde o quadro.
- Exame físico realizados pelo médico especialista, como o Teste de Lachman, Teste da Gaveta Anterior e Teste do Pivot-Shift. Por isso a importância de se escolher um ortopedista especialista em joelho, quem pode avaliar com maior segurança o seu joelho.
- Complementação com exames de imagem, sendo os mais comuns a radiografia simples (raio-X) e a Ressonância Magnética (RM).
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Tratamento das lesões de LCA
Existem fundamentalmente dois enfoques no tratamento da lesão do Ligamento Cruzado Anterior: o tratamento conservador (sem cirurgia) e o tratamento cirúrgico. Ambos têm suas vantagens, desvantagens e implicações para o paciente.
Diversos fatores devem ser considerados:
- Presença ou não de lesões concomitantes.
- Preferências e expectativas individuais do paciente.
- Idade do paciente.
- Nível de atividade física do paciente.
- Exame físico do paciente: presença ou não de sinais de instabilidade do joelho.
- Pacientes jovens, especialmente aqueles em fase de crescimento, com uma lesão do LCA precisam ser avaliados com rapidez antes de retornarem à rotina de esportes e brincadeiras.
Cabe ao médico orientar o paciente sobre o problema e discutir as opções de tratamento, buscando uma abordagem personalizada. A decisão final, no entanto, sempre fica a cargo do paciente e seus familiares.
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Como é feita a cirurgia do LCA?
Atualmente, a técnica cirúrgica mais comum para reconstrução do Ligamento Cruzado Anterior é a artroscopia, na qual os tendões flexores são utilizados como enxerto.
Geralmente, a anestesia mais empregada durante essa cirurgia é a raquianestesia, frequentemente combinada com sedação para proporcionar conforto ao paciente.
O procedimento cirúrgico envolve as seguintes etapas:
- Remoção dos tendões a serem usados como enxerto.
- Inserção da câmera para visualização interna do joelho.
- Verificamos se há outras lesões.
- Identificação da localização correta para ser usada como local de fixação do novo ligamento.
- Criação de túneis ósseos para fixação do enxerto.
- Fixação do enxerto nos túneis ósseos.
Após a cirurgia, caso tudo transcorra conforme o planejado e o paciente se recupere bem da anestesia, ele é transferido para o quarto. Geralmente, recomenda-se que o paciente permaneça internado por uma noite no hospital, onde recebe medicamentos para dor e antibióticos preventivos. No dia seguinte, os curativos podem ser trocados, são fornecidas orientações sobre exercícios leves a serem realizados em casa e, então, o paciente recebe alta hospitalar.
E quando tem também uma lesão no menisco?
Sutura Meniscal
Se o menisco estiver lesionado, pode ser necessário realizar uma cirurgia para repará-lo. Uma das técnicas utilizadas é a sutura do menisco, que consiste em “costurar” a área danificada do menisco para que ele possa cicatrizar adequadamente. Esse procedimento tem por objetivo preservar o menisco, mantendo sua função de proteção do joelho, e é idealmente realizado ao mesmo tempo que a reconstrução do LCA para que tenha melhores resultados.
Tipos de Enxerto na Reconstrução do LCA
Na cirurgia de reconstrução do LCA o ligamento rompido é substituído por um enxerto, que pode ser obtido de diferentes tendões do próprio paciente. Os principais tipos de enxerto são:
– Tendões Flexores (Isquiotibiais): São retirados tendões dos músculos semitendíneo e grácil, localizados na parte de trás da coxa. A cicatriz fica normalmente na região da frente da perna, longitudinal, com cerca de 3cm. Vantagens incluem a menor dor pós-operatória na região doadora, menor dor na frente do joelho e possibilidade de cicatrizes menores.
– Tendão Patelar: Retira-se um segmento do tendão patelar com pequenos fragmentos ósseos das extremidades. A cicatriz fica na frente do joelho. É considerado o “padrão ouro” por muitos cirurgiões devido à sua resistência e estabilidade a longo prazo, mas tem indicações mais restritas.
– Tendão do Quadríceps: Retira-se uma porção do tendão acima da patela. Pode ser uma opção quando outros tendões não estão disponíveis ou em casos de reoperações.
– Tendão Fibular (do músculo fibular longo): Menos comum, é utilizado em algumas situações específicas e pode ser uma alternativa viável. Pode ser utilizado sozinho ou pode ser usado também para fortalecer algum outro enxerto retirado que não tenha a espessura necessária para alcançar a força necessária do novo ligamento reconstruído.
A escolha do tipo de enxerto deve ser discutida detalhadamente com o seu médico, levando em consideração vários fatores:
– Tipo de esporte praticado: Alguns enxertos podem ser mais adequados para esportes de alto impacto ou que exigem maior estabilidade.
– Características físicas do paciente: Idade, nível de atividade física e anatomia individual podem influenciar na escolha.
– Histórico médico: Lesões anteriores, cirurgias prévias e outras condições de saúde.
– Preferência do cirurgião: Baseada em experiência pessoal e resultados clínicos que cada um tem.
É importante entender que cada tipo de enxerto tem suas vantagens e desvantagens. Uma discussão aberta com o seu médico permitirá escolher a melhor opção para o seu caso específico.
E sobre o tempo de recuperação?
O uso de muletas é necessário por um período de 10 a 15 dias, dependendo da intensidade da dor, e muitas pessoas retomam suas atividades de escritório dentro desse intervalo, às vezes até antes. É importante iniciar a fisioterapia o mais cedo possível, preferencialmente ainda no hospital.
Inicialmente, o foco é garantir que o joelho mantenha sua extensão total, além de tratar a dor e o inchaço. Depois, partimos para a fase de ganho de força muscular e controle de equilíbrio. Sempre é importante ter um fisioterapeuta de confiança!
O progresso no tratamento é gradual, com melhorias observadas dia após dia. Se houver acesso a uma piscina, a hidroterapia pode ser uma ferramenta valiosa para acelerar a recuperação da amplitude de movimento e reduzir o inchaço quando autorizado pelo médico.
Posso pisar no chão depois da cirurgia?
Depende do tipo de lesão que foi encontrada durante a cirurgia. Se for apenas a reconstrução do LCA, o médico geralmente libera o apoio com o uso de muletas logo nos primeiros dias. Isso ajuda a dar suporte ao joelho enquanto ele se recupera. É importante seguir as orientações direitinho para evitar problemas.
Quanto tempo vou precisar ficar afastado do trabalho?
O tempo de afastamento do trabalho depende do tipo de atividade que você faz. Se for um trabalho mais leve, como em escritório, você pode voltar em 2 a 4 semanas. Mas, se o seu trabalho envolve esforço físico, muito movimento, atividades em altura…. pode ser necessário de 3 a 6 meses para retornar, sempre seguindo a orientação do seu médico.
Quando posso voltar a dirigir carro?
Em geral, é recomendado esperar de 4 a 6 semanas, dependendo de como a recuperação está indo. O mais importante é garantir que o joelho tenha força e mobilidade suficientes para dirigir com segurança. A liberação para voltar ao volante será feita pelo médico, que vai avaliar se o paciente já está pronto.
Quando posso voltar a correr?
Normalmente, você pode voltar a correr em linha reta entre 3 a 4 meses após a cirurgia, se a recuperação estiver indo bem. Antes de correr, é importante que o joelho esteja estável e que o médico e o fisioterapeuta liberem essa atividade.
Quando posso voltar ao esporte?
O retorno às atividades esportivas é um processo longo, geralmente levando de 9 a 12 meses. Isso se deve ao período de remodelação que ocorre no enxerto, no qual a força máxima não é atingida até aproximadamente 9 meses após a cirurgia e diversos outros fatores, inclusive psicológicos dos pacientes, que devem ser levados em consideração.
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Atletas que superaram a lesão do LCA:
.Muitos atletas profissionais já passaram por essa lesão e voltaram com sucesso às competições:
– Neymar Jr.: Recentemente, em outubro de 2023, durante uma partida das Eliminatórias da Copa do Mundo contra o Uruguai, Neymar sofreu uma lesão grave no joelho, incluindo a ruptura do LCA e do menisco. Atualmente, ele está em processo de reabilitação, mostrando determinação para retornar aos campos e continuar brilhando no futebol mundial.
– Rebeca Andrade: A ginasta brasileira enfrentou múltiplas lesões no LCA ao longo de sua carreira. Após cirurgias e intensa reabilitação, conquistou medalhas de ouro e prata nos Jogos Olímpicos de Tóquio em 2021, tornando-se um símbolo de superação.
– Marta: Em 2022, aos 36 anos, a renomada jogadora de futebol brasileira sofreu uma lesão do LCA durante um jogo pelo Orlando Pride na NWSL. Após cirurgia e reabilitação rigorosa, Marta retornou aos gramados, inspirando fãs ao redor do mundo com sua habilidade e paixão pelo esporte.
– Klay Thompson: Jogador de basquete da NBA pelo Golden State Warriors, sofreu uma lesão do LCA em 2019. Após reabilitação, enfrentou outra lesão (ruptura do tendão de Aquiles) que prolongou seu afastamento. Retornou às quadras em 2022, demonstrando resiliência e dedicação.
Esses exemplos mostram que, com o tratamento adequado e comprometimento com a reabilitação, é possível retornar às atividades esportivas e alcançar novos patamares.
Como posso ajudar?
Como ortopedista especialista em Cirurgia do Joelho, tenho ampla experiência no tratamento de lesões do LCA e do menisco, seja por meio de abordagens conservadoras ou cirúrgicas. Utilizo técnicas modernas e minimamente invasivas para proporcionar uma recuperação mais rápida e eficaz.
Trabalho em conjunto com uma equipe multidisciplinar de fisioterapeutas, com a qual podemos oferecer um plano de tratamento completo e personalizado.
Discutiremos detalhadamente as opções de enxerto mais adequadas para o seu caso, levando em conta o tipo de esporte praticado, suas características individuais e outros fatores relevantes.
Meu objetivo é ajudar você a retornar às suas atividades com segurança e confiança. Se você sofreu uma lesão no joelho ou apresenta sintomas relacionados ao LCA e menisco, estou à disposição para oferecer uma avaliação detalhada e orientá-lo sobre as melhores opções de tratamento.
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